quinta-feira, 9 de setembro de 2010

David vence Golias

"Neste painel representa-se o triunfo do David, um jovem pastor que virá a ser rei de Israel, sobre o gigante filisteu, de nome Golias. David indignado com a jactância blasfema de Golias e com a cobardia dos militares israelitas oferece-se para o enfrentar sozinho. Adquirida a autorização real revestem-no com o equipamento militar. Davida rejeita-o e, confiado em Deus, avança para o combate munido tão só de uma funda e de cinco pedras. Logo à primeita atinge o inimigo na fronte derrubando-o. Depois tira-lhe a espada e corta-lhe a cabeça. Encorajados por esta vitória os soldados israelitas vançam sobre os inimigos que fogem aterrorizados. David é uma sombra de Jesu Cristo que venceu o Maligno ( Golias) com a funda da Sua Cruz. Abaixo coloca-se uma reflexão de Nuno Serras Pereira sobre este acontecimento." Frei Nuno Allen

O Combate


1. Nos seus cinco sermões sobre as cinco pedras que David recolheu no fresco e murmuroso regato antes de avançar destemido ao encontro do colossal Golias, o P. António Vieira pergunta qual das pedras derribou o enorme gigante. Na sua interpretação simbólica as pedras lisas e brancas significam os estigmas de Cristo, sendo que a que foi direita à testa do monstro era a chaga do lado, isto é, a do coração trespassado. O mesmo é dizer que foi o amor de Cristo, o Seu sagrado coração, que triunfou sobre a ameaça pavorosa que entrevava o amedrontado povo de Deus.


2. Despedindo-nos, agradecidos, do arguto Vieira e da sua sagaz contribuição convirá notar diligentemente que o galhardo eleito, ungido largamente pelo Altíssimo, repugna a rija armadura e as poderosas armas mortíferas, próprias da forte arte guerreira, fruto amadurecido de antigas sabedorias humanas, acumuladas meticulosamente ao longo de aguerridas gerações, por uma dilatada tradição de eruditas e detalhadas planificações militares, de elaborados projectos amplamente penetrados de uma eficiência toda pragmática.

David atenta à novidade da circunstância, apega-se ao essencial e, com a agilidade - um dos dons do Espírito Santo - ligeira de uma frágil gazela, pobre, livre, despojado, de mísera funda na mão, ousa, com determinação firme, lançar, com pontaria certeira, uma pedrada formidável, ao principal, à cabeça medonha, à raiz do tenebroso mal.



3. Podemos colher nesta narração breves indicações preciosas: a) é na humanidade de Cristo[1] e, mais concretamente, na Sua Paixão, que nos encontramos com o amor do Pai: "Quem me vê, vê o Pai." É na contemplação de Cristo que se conhece o Pai; b) é no Seu (de Cristo) coração, na simplicidade do Seu amor, que nos é dada a força para vencer o mal; c) desse mal se triunfa, fundamentalmente, convertendo, pelo mesmo amor, aqueles que por ele são escravizados;[2] d) importa desprendermo-nos do acessório e tradicional (não no sentido de Tradição, mas de tradicionalismo) e apegarmo-nos ao essencial; e) as circunstâncias são acontecimentos através dos quais Deus nos fala e/ou vem ao nosso encontro; f) importa discernir e detectar a origem, a raiz, a cabeça dos problemas do mundo para se poder alcançar adequadamente o objectivo pretendido: a cabeça de Golias pode significar a razão, encerrada no racionalismo, que, mutilando a realidade, tem a pretensão, tendo como referência os impossíveis da mentalidade dominante, de anular a categoria da possibilidade. Não se trata só da razão fechada à fé ou ao sobrenatural, mas da razão técnica, do poder, manipuladora, fugitiva do ser, cega para a metafísica. Esta razão inventiva, entregue a si própria, produz instrumentos, artefactos, fascinantes, fantásticos, numerosos, admiráveis pela sua utilidade, mas, ultimamente, torna-se violenta, totalitária, agredindo o homem na sua humanidade, seduzindo-o e escravizando-o. A pedra - a fé e o amor - que a penetra representa o escancarar do cárcere, a sua abertura à realidade esplêndida e magnífica na totalidade dos seus factores. O colosso desmedido, desproporcionado, estatelado por terra e degolado pela espada acutilante - a Palavra de Deus - , significará a extracção das deformações da cultura actual, das doutrinas dos "falsos mestres", isto é, a superação da disformidade, do monstruoso, o regresso à proporção ordenada e harmoniosa dos vários factores, na sua justa hierarquia. (Nuno Serras Pereira)


[1] A polémica de Sta. Teresa de Ávila, com algumas inteligências teológicas do seu tempo, em defesa da imprescindibilidade da humanidade de Cristo ¾ nos seus escritos, recorre explicitamente ao exemplo e ‘autoridade’ de S. Francisco de Assis ¾ para a verdadeira oração e para a alta contemplação pode ser de grande utilidade no auxílio aos que estão contaminados pela New Age.
[2] O amor ao "Sagrado Coração de Jesus" é, também, um amor àqueles por quem Ele, amando, deu a vida, isto é, por todos. O amor de Cristo é não só um amor a Ele próprio, mas também a Ele capilarmente presente na sua Igreja, no Seu Corpo. Cristo, como dizia St. Agostinho, já não se pode pensar sozinho, é sempre Ele, a cabeça, e os Seus membros. Pode, ainda, adiantar-se que segundo a hipótese teológica do actual Cristocentrismo ( Inos Biffi, Giacomo Biffi, Angelo Scola, Luigi Giussani, etc.) fomos criados, não através do Verbo em vista de Cristo, mas sim, por Cristo, o Verbo encarnado. Parece, por isso, poder-se afirmar, num certo sentido, que "somos feitos de Cristo", em Cristo e para Cristo. Assim, o amor a Cristo passa inevitavelmente pelo amor à Sua "presença capilar" em todos. Sendo a conversão um acesso à identidade própria.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Nossa Senhora da Luz

"Este painel parece representar o nascimento ou natividade da Virgem Maria, Senhora nossa. Chama-se Nossa Senhora da Luz porque essa "Luz (que) resplandece nas trevas" (prólogo do Evangelho segundo S. João), o Seu Filho Jesus Cristo, já a encheu do Espírito Santo, desde o instante da concepção, em virtude dos méritos futuros da Sua Paixão. Assim Nela nunca houve trevas mas tudo foi sempre luminosidade de Deus. Por isso Ela é a Aurora que precede e gera o dia, o Sol, que é o Seu Filho, Deus humanado. Ao fundo, ainda no leito, vemos Santa Ana, Sua mãe, e de pé, à nossa esquerda, S. Joaquim, Seu pai. Conhecemos os nomes de seus pais por uma tradição extra-Bíblica. A natividade ou nascimento da sempre Virgem Maria celebra-se a 8 de Setembro." Frei Nuno Allen

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Santo Inácio de Loyola

Imagem de Santo Inácio de Loyola e uma oração por ele composta: "Tomai, Senhor, e recebei, toda a minha liberdade, a minha memória, o meu entendimento e toda a minha vontade. Tudo quanto tenho e possuo de Vós o recebi. Por isso a Vós, Senhor, o entrego e restituo para que disponhais de tudo segundo a Vossa vontade.
Concedei-me somente o Vosso amor e a Vossa graça, que isto me basta, nem outra coisa desejo da Vossa misericórdia infinita." Santo Inácio de Loyola

domingo, 5 de setembro de 2010

S. Francisco de Assis prega aos pássaros e demais criaturas

Este pormenor, de um painel do Arquitecto João Sousa Araújo, mostra-nos S. Francisco pregando aos pássaros. O seu primeiro biógrafo, frei Tomás de Celano narra-nos o acontecimento: "Chegado perto de Bevanha, viu  reunido um bando enorme de aves das mais diversas espécies: pombos bravos, gralhas e fouvos.
Ao vê-las, o bem-aventurado servo de Deus Francisco, homem de grande sensibilidade e singular ternura pela criaturas irracionais e inferiores, correu alegremente para elas, deixando no caminho os companheiros. E estando já perto, vendo que elas o esperavam, saudou-as como era seu costume ("O Senhor vos dê a paz"). Notando com espanto que elas não fugiam, como sempre fazem,, com imenso gozo e humildade lhes pediu se dignassem escutar a Palavra de Deus. Entre outras coisas disse-lhes: 'Avezinhas, minhas irmãs, muito tendes que louvar o vosso Criador e amá-l' O de contínuo, já que vos deu penas para vos cobrir, asa para voar e tudo o mais de que haveis mister. Fez-vos nobres entre as demais criaturas e deu-vos por morada a limpidez do espaço. Não semeais nem colheis e, apesar disso, Ele vos protege e guia, libertando-vos de preocupações'. Ao ouvirem estas palavras, as avezinhas - segundo ele próprio contava, assim como os irmãos que estiveram presentes - manifestavam a sua alegria conforme podiam: alongando o pescoço, espanando as asas, abrindo o bico e olhando para ele. E ele, passando pelo meio delas, ia e vinha, roçando com a sua túnica em suas cabecitas e corpos. Por fim, abençoou-as e, feito o sinal da cruz, deu-lhes licença para seguirem à sua vida, indo também ele à sua, com os companheiros, cheio de alegria e louvando o Senhor, a quem todas as criaturas veneram com tão devotas manifestações.
Como era homem simples, não por natureza mas pela graça, grandemente se lastimava de haver sido tão negligente, pois tendo os pássaros escutado com tanta devoção a divina palavra, ainda lhes não tinha pregado até esse momento. Desse dia em diante começou ele a exortar todas as aves, todos os animais, todos os répteis, e até as criaturas inanimadas, a louvarem e a amarem o Criador, já que, por experiência própria, comprovava como lhe obedeciam quando invocava o nome do Senhor ...
Que arrebatamento o seu quando admirava a beleza das flores ou lhe aspirava o delicado perfume! Imediatamente se reportava à contemplação dessa Flor primaveril (Jesus), radiosamente nascida do tronco de Jessé, e que, mercê da sua fragrância, restituíra a vida a milhares de mortos. Quando encontrava muitas flores juntas, pregava-lhes e convidava-as a louvarem o seu Senhor, como se fossem dotadas de razão. O mesmo fazia diante dos trigais e dos vinhedos, dos rochedos e das florestas, das belas paisagens ridentes, das fontes, dos jardins, da terra e do fogo, do ar e do vento, convidando-os com simplicidade e pureza de alma a amarem e a louvarem o Senhor. A todos os seres chamava irmãos. Com penetrante intuição lograva descobrir de uma maneira maravilhosa e de todos desconhecida o mistério das criaturas, pois gozava já da gloriosa liberdade dos filhos de Deus. Agora que ele está nos Céus, com os Anjos te louva, ó bom Jesus - ele, que na terra proclamava diante de todas as criaturas, que só Tu és digno de amor infinito." (Frei Tomás de Celano - Vida Primeira, nn. 58 e 81)